Um problema chamado motocicleta
Originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo.
por Antonio Penteado Mendonça
A motocicleta é uma grande invenção, principalmente quando usada nas grandes cidades, onde o trânsito é um desastre.
Descartando a forma alucinada de dirigir de malucos sem noção de perigo ou risco de vida, a imensa maioria dos motociclistas são pessoas sensatas que sabem o que fazem, que respeitam as regras e tomam os cuidados necessários para voltarem para casa sem sofrerem acidentes, pilotando suas motos.
A maioria das mortes em acidentes de trânsito envolve motocicletas e tem como vítimas os motociclistas ou os caronas. É um dado sério, que precisa ser levado em conta na formulação de qualquer política viária de transporte e locomoção, inclusive para o desenvolvimento de regras e a criação de campanhas de conscientização e educação no trânsito capazes de modificar o quadro.
Com a pandemia da covid19 houve a explosão do uso de motocicletas por conta do crescimento impressionante dos serviços de entrega por aplicativo. Num momento seríssimo da vida socioeconômica nacional, com o desemprego em patamares muito elevados, motos e carros foram instrumentos de equilíbrio e paz social, graças ao uso intensivo dos serviços de locomoção e entrega através dos celulares.
Daí pra frente, as motos se consolidaram como meio de ganhar a vida para milhares de brasileiros. Faz pouco, conversando com um diretor de uma das grandes empresas de entrega por aplicativos, ouvi abismado que eles fazem milhões de viagens semanalmente. E por isso, levando em conta sua responsabilidade social, haviam desenvolvido um sofisticado programa de seguro de acidentes pessoais para proteger os motociclistas trabalhando para eles.
De outro lado, os bandidos descobriram que as motos são ferramentas quase perfeitas para praticarem assaltos na cidade. Ágeis, rápidas e pequenas são o mais eficiente instrumento de fuga, além de se prestarem para abordar as vítimas com rapidez e, até pouco tempo atrás, sem levantar suspeitas.
Como se não bastasse, os bandidos descobriram que se vestirem como entregadores das empresas de aplicativos ainda por cima facilitava também, além dos assaltos nas ruas, o assalto a residências. E eles passaram a assaltar os entregadores para roubar suas motos e suas roupas.
O resultado é que São Pulo vive um momento delicado, com a segurança pública ameaçada pela ação dos bandidos que se disfarçam de entregadores de aplicativos, muitas vezes após assaltarem um motociclista trabalhando, para roubarem pessoas nas ruas e dentro de imóveis, se valendo da confiança da população nos profissionais que realmente trabalham com entregas solicitadas pelos celulares.
É um quadro duas vezes cruel, em primeiro lugar pelos assaltos, muitas vezes violentos, praticados por estes bandidos e, em segundo, porque joga a pecha de criminoso sobre milhares de trabalhadores honestos que ganham a vida exercendo uma das profissões mais estressantes que existem. Como se não bastasse, o quadro atual tem tudo para encarecer o seguro de motocicleta.
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