Seguro e as tragédias do verão
Originalmente publicado no jornal SindSeg SP.
por Antonio Penteado Mendonça
O verão ainda está relativamente distante, mas as primeiras tempestades já atingiram o Brasil. Todos os anos, as tempestades de verão cobram um preço caro dos brasileiros. Entre mortos, feridos, destruição de patrimônio e as mais variadas perdas que empobrecem a sociedade, as tempestades e seus desdobramentos engolem bilhões de reais e reverberam a dor de milhares de pessoas que perdem praticamente tudo.
As tempestades já começaram a cair em São Paulo. Foram poucos eventos, mas a violência da chuva e a quantidade de água foram suficientes para inundar ruas, casas e estabelecimentos comerciais, como se estivéssemos em janeiro, época em que estes fenômenos são normais.
Como sói acontecer, o número de bueiros entupidos foi um grande aliado das águas, que, não tendo para onde correr, se espalharam pelas calçadas, entraram por debaixo das portas, arrastaram carros e depois ficaram languidamente empoçadas na entrada das bocas de lobo, que simplesmente não as engoliam porque os canos estão obstruídos por todo tipo de lixo e sujeira.
Pela violência com que as chuvas chegaram em São Paulo e várias outras cidades espalhadas pelo país, é de se esperar que nos meses certos, nos meses de verão, as chuvas sejam muito mais fortes e causem muito mais danos, inclusive em extensas áreas ainda não atingidas.
Tragédias como deslizamentos de morros, desmoronamento de imóveis, veículos inundados, imóveis cheios de água, queda de árvores, queda de muros, interrupção do fornecimento de energia, lama e lixo ao longo das ruas e dentro das casas serão parte da paisagem, com tudo de dramático que trazem consigo.
As apólices de riscos patrimoniais brasileiras oferecem cobertura para boa parte dos danos causados pelas tempestades de verão e outros fenômenos típicos da época do ano, como tornados, vendavais, vento forte, furacões e granizo. No entanto, a maioria dos imóveis atingidos não tem a garantia de seguro apropriada. Vale dizer, apesar dos prejuízos poderem ser segurados, as seguradoras praticamente não sentem o seu impacto porque, como os brasileiros não contratam estes seguros, elas não pagam as indenizações.
Nem se diga que o seguro não é contratado porque o povo não tem dinheiro para isso. É verdade, as camadas mais afetadas pelos eventos de verão não têm dinheiro para contratar seguros. Assim, além de terem seus imóveis inundados e de perderem tudo que tem dentro, ainda por cima ficam sem ter qualquer tipo de socorro, porque o governo demora para prestar auxílio e indenizar as vítimas.
Que o digam os moradores da região serrana do Rio de Janeiro. Lá, parte importante das vítimas era da classe média e até hoje as indenizações devidas em decorrência da tragédia que se abateu sobre Petrópolis e seu entorno não foram pagas, nem ninguém fala mais nelas.
As mudanças climáticas não são uma invenção da imprensa comunista para desestabilizar as nações democráticas. Elas estão aí, tanto faz o viés ideológico do governo do país atingido. Da extrema esquerda à extrema direita, os países são atingidos por eventos cada vez mais fortes e mais recorrentes. E os prejuízos somam ordem de grandeza cada vez mais aterradora e difícil de ser suportada pelos governos.
O seguro é uma ferramenta que minimiza os prejuízos econômicos, mas não impede a ocorrência dos eventos, nem consegue restringir os danos. Atuar sobre a ocorrência dos eventos é impossível. O aquecimento global não respeita fronteiras e os fenômenos decorrentes dele se espalham com a sem cerimônia de quem sabe que é mais forte.
O que é possível fazer é impedir que as áreas mais sujeitas a danos dessa natureza sejam ocupadas. Como, na prática, os governos fazem pouco para evitar isso, elas acabam invadidas pelos mais pobres, que não têm outro local para morar.
E aí, mais uma vez, a desigualdade social mostra sua cara e aumenta o fosso que separa os pobres e os ricos. Quem contrata seguro são os mais ricos, assim eles diminuem suas perdas. Os mais pobres, esses perdem tudo e mal e mal recebem alguma esmola do Poder Público.
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