Planos de saúde – duas realidades opostas
Originalmente publicado no jornal SindSeg SP.
por Antonio Penteado Mendonça
Os planos de saúde privados brasileiros atravessam um momento particularmente complicado.
Provavelmente, o dano maior é que se transformaram em assunto recorrente, servindo de vitrine para o feio e o errado que as empresas praticam em nome do capitalismo.
O curioso é que muitas das notícias publicadas com viés negativo, se forem lidas com atenção, mostram um cenário bastante diferente. É o caso da informação de que no primeiro semestre de 2018 foram distribuídas 16 mil ações na Justiça paulista, a maior do país.
Se levarmos em conta que o universo atendido pelos planos de saúde privados atinge 47 milhões de pessoas, que as operadoras autorizam perto de um bilhão e meio de procedimentos por ano, que boa parte das ações versa sobre reajuste de preço e que São Paulo deve ter algo próximo da metade dos segurados, só podemos concluir que 16 mil ações em um semestre, ao contrário do sentido dado pela notícia, atestam que o sistema funciona.
Todavia, a recente pancadaria de que são alvo as operadoras tem deixado o bom senso de lado para entrar no campo do linchamento, com resultados ruins para todos, a começar pelo Governo, que vê a fila do SUS crescer, passando pelos segurados, que no mínimo estão inseguros quanto ao futuro, para acabar nas operadoras, que, não bastassem as ameaças reais, anda são difamadas no atacado, como se todas estivessem no mercado para enganar a população.
Esse quadro não é bom para ninguém, especialmente neste momento, quando, segundo um diretor da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) me disse, mais ou menos metade das operadoras não tem escala para permanecer no mercado. Ou seja, é essencial se encontrar uma forma de viabilizar a transferência de seus segurados para empresas saudáveis, sob risco de deixarem de ser atendidos porque seus planos estão quebrando.
O problema é como fazer isso, levando em consideração todas as variáveis envolvidas, a começar pelo subdimensionamento do preço pago por milhares deles, que precisa ser ajustado no caso da migração para uma outra operadora.
A lei dos planos de saúde privados brasileira é um desastre. Se não se fizer nada para modificá-la, em algum momento não muito distante o sistema entrará em colapso, acabando de estourar com a saúde pública garantida pelo SUS (Sistema Único de Saúde), que não tem dinheiro para custear mais que 35% do total das despesas com saúde no país. Este é um dado importante. Mais de 60% do total dos recursos investido em saúde provém dos planos privados, que atendem apenas ¼ da população.
O outro lado da moeda é o que acontece atualmente nos Estados Unidos. Lá, a ordem de grandeza dos recursos destinados à saúde atinge espantosos 3,5 trilhões de dólares por ano. Uma única operadora fatura perto de 200 bilhões de dólares, ou seja, muito mais do que a totalidade dos recursos públicos e privados investidos no setor de saúde no Brasil.
O resultado disso é que, enquanto no Brasil as operadoras de planos de saúde interessadas em saírem do mercado não encontram compradores, nos Estados Unidos os fundos privados de investimento estão à caça de empresas que atuem na área da saúde, desde operadoras de planos até fornecedoras de serviços, como ambulâncias, “home care”, distribuidoras de insumos para saúde, laboratórios, etc.
A diferença fundamental entre os cenários, muito mais do que a ordem de grandeza dos recursos envolvidos, é a forma como o negócio é visto nos dois países. Enquanto no Brasil medicina não pode ser negócio, ainda que parte das operadoras sejam sociedades anônimas e os prestadores de serviços paguem imposto de renda, nos Estados Unidos cada um atua como quiser, com e sem distribuição de lucro, dependendo do objetivo social. Mas mesmo as operações bancadas por fundações e outras entidades sem fins lucrativos têm como princípio básico o resultado positivo, até porque é a única forma de bancarem os investimentos cada vez mais caros, necessários para sua operação.
Nesta vida é mais fácil copiar do que criar. É só no basearmos no que já é feito lá para melhorarmos o que é mal feito aqui.
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