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Crônicas & Artigos

em 23/12/13

Clausulado claro e em português

Originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo
por Antonio Penteado Mendonça

Um dos maiores problemas do setor de seguros é que toda a operação é feita em cima de um contrato relativamente sofisticado e de compreensão nem sempre fácil. Em função de terminologia própria, conhecida apenas pelos que militam no segmento, a maioria das pessoas tem dificuldades para absorver os conceitos e entender sua aplicação. Assim, surgem problemas que poderiam ser evitados se as apólices levassem em conta o nível de escolaridade dos consumidores.

O Brasil é um país com baixo nível de escolaridade, entendendo-se por isso baixa capacidade de compreensão dos textos. Quer dizer, o brasileiro lê, mas não entende o que lê. Ele soletra corretamente as palavras, mas não consegue atinar com o significado delas. O resultado é a pessoa imaginar que está comprando uma coisa quando, de verdade, está levando outra completamente diferente.

E se o cenário vale para textos simples, imagine a dificuldade para entender um contrato escrito com termos que ele nunca ouviu falar na vida. A começar pela palavra prêmio, que induz inclusive pessoas com formação superior a erro, imaginando que se trata do pagamento da indenização, o vocabulário técnico do setor não ajuda a facilitar as coisas.

Mesmo os glossários que integram as apólices, ainda que facilitando a vida do leitor, não tornam clara a compreensão do que está sendo contratado. Em primeiro lugar, a maioria das pessoas não vai voltar para o glossário ao se deparar com uma palavra desconhecida, inserida no meio do texto da apólice. E menos ainda se ela estiver numa condição especial, lá no fim, depois das condições gerais.

Aliás, seria interessante começar com essas duas definições: condições gerais e condições especiais. Quantas pessoas sabem qual prevalece na execução do contrato de seguro? Quantos conhecem as exclusões de uma e de outra e quais as que serão aplicadas no momento da regulação do sinistro?

Indo além, quantas pessoas sabem o que significa a sinistra palavra sinistro? De qualquer forma, é tenebrosa o suficiente para causar medo. Mas, na prática, ela apenas define o evento danoso que causa prejuízo para o segurado e está coberto pelo seguro, ou seja, o evento que gera a obrigação da seguradora pagar a indenização.

Dependendo do tipo do seguro, se proporcional ou não proporcional (o que, mais uma vez, pouca gente sabe o que quer dizer), são aplicáveis definições e fórmulas incompreensíveis até para quem está no mercado já faz tempo.

Conceitos como rateio e rateio parcial não são fáceis de serem assimilados pelo cidadão comum. E se eles não são, imagine a consequência de sua aplicação ao contrato do seguro: a indenização devida será reduzida proporcionalmente, em função do valor do bem na data do sinistro ser menor do que seu valor de mercado.

Se o segurado lembrar que ele segurou o bem pelo seu valor na data da contratação do seguro, ele terá dificuldades para entender como o valor do bem na data do sinistro pode interferir no valor da indenização, inclusive reduzindo a quantia a que tem direito.

O contrato de seguro é um contrato de adesão relativa. O segurado é obrigado a aceitar o clausulado da apólice, mas ele obrigatoriamente interfere no contrato, determinando o bem segurável, o valor máximo da indenização, os beneficiários, as cláusulas acessórias, etc.

Sem perder de vista que se trata de um contrato, quanto mais objetivo for o português da apólice, menor a chance de problemas. Não usei “português” por capricho. Não, todos os contratos de seguros emitidos no Brasil devem ser redigidos em português. Assim, ainda que haja uma versão em outra língua, ela estará subordinada à apólice escrita em português, tanto para efeito da relação seguradora/ segurado, como para a relação seguradora/ressegurador.

Com a entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor, as seguradoras melhoraram a comunicação com os segurados Mas ainda há muito a ser feito, especialmente por conta da chegada de uma nova classe média.

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