As seguradoras não darão conta
Originalmente publicado no jornal SindSeg SP.
por Antonio Penteado Mendonça
A única certeza é que o sistema internacional de seguros não tem capacidade para fazer frente ao total das indenizações decorrentes dos sinistros que devem atingir a humanidade nos próximos anos.
Hoje, se todos os sinistros fossem indenizados, as seguradoras já não teriam capacidade para arcar com as indenizações. Aliás, se apenas os sinistros acontecidos nos países ricos tivessem cobertura de seguro seria suficiente para inviabilizar o sistema porque o total dos prejuízos é maior do que o limite operacional do setor.
A soma das capacidades das seguradoras e das resseguradoras não cobriria as indenizações, ainda que os eventos acontecendo em locais e tempos diferentes, que é a base da operação de seguro. Os sinistros acontecem em determinado lugar, atingindo um determinado número de segurados, enquanto outros, em princípio a maioria, ficam à margem, não são afetados pelas perdas, o que faz com que a soma de todos os prêmios seja suficiente para pagar as indenizações.
É aí que mora o problema, ou o primeiro dos problemas. Os eventos estão acontecendo cada vez com mais frequência e os danos também têm aumentado de valor. Quer dizer, a ocorrência de um número maior de eventos, somada ao aumento do valor dos prejuízos, seja pelo número de pessoas atingidas, seja pelo custo mais alto dos danos, tem como resultado o aumento dos valores pagos a título de indenização e, a se manter a tendência – o que é uma certeza no campo dos eventos de origem climática –, os pagamentos de sinistros podem atingir patamares capazes de inviabilizar todo o sistema.
Já existem regiões que são riscos excluídos pelas seguradoras. É o caso de Miami para o risco de furacão ou de parte da Itália para o risco de terremoto. A ordem de grandeza dos danos torna impossível garantir cobertura securitária para os imóveis ali localizados.
Seguradoras e resseguradoras estão cientes do problema e faz tempo que estudam a fundo os novos riscos que ameaçam o ser humano, os quais são extremamente variados e abrangem um amplo espectro de situações.
Faz tempo que são tomadas medidas destinadas a minimizar os danos. Por exemplo, as construções chilenas, em função da alta incidência de terremotos, têm normas de construção mais severas do que as construções brasileiras.
Mas essas medidas são claramente insuficientes diante do novo cenário. A urbanização do planeta, com cada vez mais gente trocando o campo pela cidade, tem um impacto dramático no quadro. O aumento da concentração de pessoas e de suas atividades em áreas relativamente pequenas, mais sujeitas a desastres naturais, é um processo irreversível nos países do terceiro mundo.
Enquanto isso, nos países desenvolvidos, onde a concentração urbana é realidade faz mais tempo, o aumento da intensidade dos eventos também tem sido devastador. Basta olhar o que aconteceu na Alemanha, por causa das chuvas, e em Nova Iorque, por causa do furacão Ida.
Mas não são apenas os eventos de origem climática que podem elevar a conta. As pandemias estão aí e devem continuar cobrando preços cada vez mais caros de bilhões de pessoas atingidas por elas. E as ações humanas também têm sua parte no custo total dos prejuízos. Ações criminosas ou culposas envolvendo o universo da TI, internet, automação, etc., já custam trilhões de dólares por ano e a tendência é esse número subir bastante no futuro.
Este ano o setor de seguros deve ultrapassar a casa dos sete trilhões de dólares de faturamento. É uma ordem de grandeza relevante, maior do que o PIB da maioria dos países. Todavia, apenas os “sequestros” cibernéticos, em 2021, devem ultrapassar a casa dos vinte bilhões de dólares em prejuízos. As perdas globais decorrentes da pandemia do coronavírus devem ultrapassar em muito os trilhões de dólares. E as perdas provocadas pelos eventos de origem climática não ficam atrás.
Nesse cenário é poesia imaginar que o setor de seguros dará conta do recado. Não tem como. Ou os governos e as seguradoras começam a conversar e delimitar as respectivas áreas e limites de atuação ou a história vai acabar mal.
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