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Crônicas & Artigos

em 04/03/24

As chuvas não acabaram

Originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo.
por Antonio Penteado Mendonça

As chuvas de verão não acabaram. Ao contrário, reza a lenda que o mês de março pode ser o mais crítico, o capaz de causar mais danos em todas as regiões brasileiras.
Janeiro choveu muito, fevereiro também, não há razão para março quebrar a sequência e é aí que mora o perigo. O solo de uma grande área do país já está encharcado, então, qualquer chuva a mais é capaz de causar danos e os prognósticos para os próximos dias não são tão amáveis assim. Pode haver chuva de forte intensidade, aliás, como tem acontecido regularmente, em todo o território nacional.

Quem disser que as mudanças climáticas não existem e que está tudo como sempre foi ou é alienado ou é mentiroso, não tem terceira opção. Até porque, este ano, reforçando os estragos decorrentes do aquecimento global, o El Niño está aumentado a força das tempestades.

Quanto os estragos da chuva já custaram é um dado que não foi publicado. Nem sei se alguém consolidou essas perdas, mas, de qualquer forma, é ver a violência das águas transformando as ruas em leitos de rios para se ter certeza de que estamos falando de bilhões de reais, se a soma englobar o Brasil inteiro.

O dado triste é que as maiores vítimas dos temporais são as pessoas menos favorecidas, milhares das quais perderam tudo o que possuíam, destruído pela enxurrada ou pelas encostas que descem com a sem cerimônia de quem sabe que é a mais forte.

Zonas rurais e zonas urbanas, indistintamente, estão sendo castigadas por uma sequência interminável de tempestades que caem de sul a norte do país. Dizer que o local mais atingido foi aqui ou foi ali é indiferente, especialmente para as vítimas das tempestades. Para elas tanto faz se choveu mais em outro lugar. A chuva que caiu onde elas moram e os ventos que assolaram suas residências são o que importa. Os dados estatísticos não têm nenhum valor para quem perdeu tudo, vítima de um evento climático que levou as lembranças, os sonhos e todas as possibilidades de uma vida melhor. Para elas a pergunta é: “e agora, como recomeçar?”

Como o Brasil praticamente não tem seguro para esses riscos, a única opção é o auxílio do governo. Mas os políticos são muito bons para falar logo depois da tragédia. Passado pouco tempo, se esquecem ou acontece outra tragédia que puxa sua atenção para outro lugar. O resultado é que tem gente esperando pelo auxílio prometido há anos, sem qualquer sinalização de que vai chegar. Mais grave do que isso, obras para minimizar os danos causados por esses eventos invariavelmente param poucos meses depois de iniciadas, deixando o local exposto a novos danos, tão logo caia a primeira chuva da temporada seguinte. E a realocação da população para áreas seguras é mais fantasia do que uma possibilidade real.

Uma alternativa relativamente barata seria a criação de um seguro social destinado a socorrer as vítimas desses eventos. Não é uma ideia mirabolante. As seguradoras têm capacidade para darem conta do recado. Só falta a vontade política de realmente assistir os mais pobres em suas necessidades reais e não em sonhos prometidos a cada eleição.

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