Ainda sobre as drogas
Originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo
por Antonio Penteado Mendonça
Eu terminei o artigo da semana passada afirmando que a epidemia das drogas que assola o Brasil afeta diretamente a atividade seguradora, não apenas nos seguros de vida, mas em todo e qualquer ramo em que se faça uma pesquisa mais cuidadosa.
É óbvio que a imensa maioria dos drogados da Cracolândia, ou dos outros que se espalharam democraticamente pela cidade de São Paulo, não possui nenhum tipo de apólice e que, portanto, não representa qualquer risco de pagamento de indenização para uma seguradora. Todavia, no momento em que dois ou três pivetes, armados com um revólver, assaltam e matam um motorista para roubar um celular e trocar por três pedras de crack, a coisa muda. Este motorista provavelmente tem um seguro de vida, tanto faz se próprio ou dado pela empresa onde trabalha, e o latrocínio vai impactar a sinistralidade da seguradora.
Pode-se alegar que um único assassinato não tem o poder de aumentar o preço do seguro. É verdade. Mas quando 50 mil pessoas são assassinadas todos os anos essa conta muda. As seguradoras precisam prestar atenção neste número, inclusive porque não há nada que indique que ele não continuará subindo. Se cada vítima de assassinato tivesse um seguro de vida de 10 mil reais, estaríamos falando de indenizações na casa dos 500 milhões de reais por ano. Como nem todas as vítimas têm seguros de vida e muitas têm apólices com capital segurado bem mais elevado do que 10 mil reais, é difícil dizer quanto os assassinatos custam anualmente para as companhias de seguros, mas com certeza é um número importante e que cresce significativamente, puxado pelas vítimas que ficam inválidas em função da violência dos assaltantes.
Outro quadro bastante comum é o uso de drogas para cometer crimes. A droga dá a coragem para ir muito além de todas as barreiras sociais. Drogado, o cidadão simplesmente não tem limite. Eu sei porque já fui assaltado por bandido drogado e, como tantos que leem o artigo, senti na pele o medo dele atirar por atirar, apesar de eu não reagir, mas colaborar para o assalto se consumar o mais rapidamente possível.
Aí surge uma nova possibilidade de impacto nas contas da seguradora: os objetos roubados ou furtados podem ter seguro e, consequentemente, a indenização deverá ser paga, agravando ainda mais a carteira de roubo da companhia. O resultado disso é que atualmente é muito difícil o cidadão comum conseguir contratar seguro de roubo para objetos como relógios, joias, equipamentos fotográficos, etc., a não ser em campanhas promocionais do tipo “compre o celular e ganhe o seguro por um ano”.
Para quem imagina que o rol de situações gravosas acabou, uma parte dos carros roubados ou furtados serve para pagar a aquisição de grandes quantidades de drogas, no Brasil ou em países vizinhos. Aliás, aqui cabe um elogio ao Governo de São Paulo. A lei estadual que regulamenta os “desmanches” já teve como efeito positivo uma queda de 15% no total de veículos roubados, o que quer dizer que, de alguma forma, o tráfico de drogas foi afetado.
Mas o problema se estende também para os imóveis, tanto faz se empresariais ou residenciais. Boa parte dos assaltantes, no momento de cometer os crimes, está drogada, complicando muito, principalmente por causa da violência descontrolada, um quadro que já é bem complicado.
Ainda no campo dos seguros, as drogas custam caro para os planos de saúde privados. Não porque as operadoras paguem necessariamente os tratamentos decorrentes do vício, mas porque uma série de outras ocorrências com origem no consumo de drogas deve obrigatoriamente ser custeada pelo plano.
Como se vê, o setor de seguros tem todas as razões e mais algumas para ter horror às drogas. Mas, mais grave do que os prejuízos financeiros, é o custo social que recai em cima da sociedade. Custo representado pela desestruturação familiar, aumento da violência, morte precoce e atendimento dos adictos, cuja maioria, com certeza, não é de bandidos, mas de pessoas que necessitam auxílio e muitas vezes não encontram.
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