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Crônicas & Artigos

em 18/06/18

Um seguro obrigatório que não tem aceitação

Os recentes acidentes causados pelo vento que virou duas embarcações no litoral do Rio de Janeiro, matando sete pessoas, levanta um tema muito importante para o setor de seguros. Até que ponto cabe à autoridade encarregada da fiscalização do setor se imiscuir nas garantias a serem dadas pelas seguradoras em diferentes modalidades de seguros?

Em princípio, os seguros obrigatórios poderiam ser vistos como produtos a serem desenhados pela SUSEP, mas, se levarmos em conta que o seguro de incêndio é obrigatório, assim como o seguro de transporte, até que ponto, na prática, isso ocorre?

De outro lado, o DPVAT é um exemplo de seguro com condições impostas e padronizadas que, também na prática, funciona bem. Todavia, o DPVAT deve ser visto dentro da sua realidade, qual seja, é um seguro administrado por uma seguradora líder que tem o monopólio da sua gestão. Ainda que as seguradoras participantes do consórcio do DPVAT tenham capacidade para agir principalmente na regulação dos sinistros, uma única companhia faz a administração do seguro, que é emitido automaticamente com o documento do veículo, quando do pagamento do IPVA.

A terceira situação é a do DPEM, o seguro obrigatório para embarcações, que até há pouco tempo tinha uma única seguradora que aceitava emiti-lo e, atualmente, não tem nenhuma, o que levou a SUSEP a informar a Marinha que, apesar do seguro ser obrigatório, no momento da regularização da documentação da embarcação ele não deveria ser exigido porque as seguradoras em operação no país não aceitavam o risco.

Coisas do Brasil, milimetricamente pensadas para dar errado e que, por isso mesmo, dão. Não consigo ver um segurador europeu ou norte-americano entendendo o que quer dizer um seguro obrigatório não ser colocado à disposição dos segurados, no caso, os proprietários de embarcações.

Lamentavelmente, esta é a realidade nacional. A lei determina a obrigatoriedade de um seguro que deveria ser contratado por todas as embarcações com bandeira brasileira, mas, no mundo real, o seguro simplesmente não existe, porque as seguradoras não estão interessadas na sua comercialização.

Alguém poderia levantar a hipótese de um locaute, mas não é o caso. O que acontece é que as condições baixadas para o seguro para embarcações e que devem obrigatoriamente ser disponibilizadas pelas seguradoras, tornam sua colocação no mercado impraticável para elas, que, de acordo com a lei, não podem ser obrigadas a comercializar o que não lhes interessa.

O impasse teria razão de ser? Não, apenas o que aconteceu é que a autarquia encarregada do setor de seguros decidiu usar seu poder e baixou as condições para o seguro obrigatório para embarcações sem se preocupar em conversar primeiro para saber se elas eram factíveis.

Da forma como estão, não eram, não são e não serão. O resultado é a situação surrealista da própria SUSEP informar ao Ministério da Marinha que ele não deve exigir o seguro obrigatório da embarcação no momento do seu registro porque o seguro não existe e ninguém pode ser obrigado a contratar o que não existe.

Parece o samba do crioulo doido, mas suas consequências vão muito além da famosa letra de samba. O que acontece é que, nos últimos anos, morreram dezenas de pessoas em acidentes com embarcações de todos os tipos e nenhuma teve a garantia mínima do recebimento da indenização do seguro obrigatório.

Ninguém discute a importância social deste seguro, especialmente na região amazônica, onde as embarcações são o meio de transporte mais comum à disposição da população.

Acontece que é justamente sua utilização na Amazônia que inviabiliza o seguro. Não tem como as seguradoras assumirem riscos não quantificáveis. Seria ir na direção contrária dos princípios básicos que norteiam o negócio. E o uso regular de embarcações clandestinas, que, em caso de acidente, poderiam gerar cobertura para as vítimas e seus beneficiários, impossibilita o dimensionamento das responsabilidades, inviabilizando a formação de um mútuo equilibrado.

É mais do que tempo do assunto voltar à pauta. A imensa malha fluvial e a costa continental brasileira exigem um seguro obrigatório que cubra as eventuais vítimas de acidentes com embarcações. O que falta para ele chegar ao mercado é a maior flexibilização das posições da SUSEP, essencialmente, no que diz respeito ao funcionamento do produto. Não adianta desenhar seguros em gabinetes. O mundo real não tem paredes, nem ar condicionado. Nele as teorias podem gerar imensos prejuízos.

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