Sobre incêndio e seguro de incêndio
Originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo.
por Antonio Penteado Mendonça
O incêndio que atingiu a região da Rua 25 de Março teve como lado positivo expor a dura realidade do centro da cidade de São Paulo, sua deterioração e seu abandono.
Uma parte dos imóveis dessa área da cidade está sendo utilizada de forma diferente das especificações originais. Prédios de escritórios e residências se transformaram em lojas e depósitos, agravando seu uso, sem que a alteração tenha sido informada às autoridades. O resultado é que esses edifícios estão legalmente irregulares. E o novo uso que lhes é dado agrava exponencialmente o risco de um incêndio de grandes proporções, como o fogo que atingiu a região da 25 de Março.
Ao não informar a mudança do uso do edifício, o condomínio fica exposto a sanções como multas e mesmo sua interdição, além do que, caso tenha seguro, corre o risco de não receber a indenização por não ter a documentação em ordem para embasar o processo de regulação de sinistro patrocinado pela seguradora.
Se o problema fosse esse, já seria caro. Afinal, um incêndio de grandes proporções destruiria o prédio e seu conteúdo, gerando o que é conhecido como “perda total”, ou seja, a destruição integral do prédio e do conteúdo.
A maioria dos imóveis residenciais e escritórios transformados em depósitos não tem as medidas de combate a incêndio exigidas por lei. Os hidrantes não funcionam, os extintores estão vencidos, não há rota de fuga, não há equipamentos ou plano para a contenção das chamas, etc.
Além disso, não há inventário regular do conteúdo estocado, inclusive porque, invariavelmente, parte das mercadorias não tem origem comprovável. Apenas o ocupante do espaço sabe o que está confinado nele, dificultando, no caso improvável do condomínio o desejar, a adoção de medidas de segurança.
Até aqui falamos de perdas e prejuízos materiais decorrentes da realidade desses imóveis. Mas há mais e da maior seriedade. É importante os síndicos desses edifícios saberem que eles podem responder nos campos criminal e civil pelas consequências de um incêndio. Um prédio com uso alterado, sem licença, sem qualquer medida de proteção, com estoques irregulares e uso indevido das instalações, que cause uma ou mais mortes pode gerar processo crime inclusive com dolo eventual contra o síndico e os conselheiros do condomínio.
No campo civil as punições também são pesadas. O seguro de incêndio é obrigatório para todas as áreas comuns dos edifícios em condomínio. A não existência do seguro pode gerar multa de até dez por cento do valor segurável. Quer dizer, além dos prejuízos decorrentes do incêndio, o condomínio, o síndico e os conselheiros podem ser multados em dez por cento do valor do prédio. Finalmente, o responsável pelos danos causados a terceiros reponde pelo seu ressarcimento. Então, os prejuízos causados a outros edifícios e mercadorias atingidos devem ser indenizados pelos responsáveis pelo incêndio original. Como eles não têm seguro, essa conta também é deles.
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