O IBGE não pode ser desmoralizado
Originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo
por Antonio Penteado Mendonça
Já faz algum tempo que os números do IBGE, logo depois de publicados, sofrem correções capazes de tirar a credibilidade da pesquisa.
Isso não pode acontecer. Os números do instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE, são importantes demais para serem publicados com erros capazes de abalar a credibilidade da instituição.
O IBGE conquistou a confiança da nação depois de muito trabalho e investimento naquilo que faz. Durante décadas as seguradoras, por exemplo, utilizaram tábuas de mortalidade norte-americanas para calcular os seus seguros de vida. As estatísticas nacionais não eram confiáveis. Ou seja, o IBGE não gozava da confiança das empresas, o que fazia com que cada uma fosse se socorrer das informações necessárias para seus negócios nas mais diversas fontes, nem sempre boas para os fins buscados.
Com o tempo, o Instituto aprimorou seu trabalho, se profissionalizou, e o resultado é que o país passou a acreditar nas informações divulgadas por ele. Em outras palavras, o IBGE adquiriu a confiança da população e passou a ser a fonte de uma série de informações utilizadas pelas mais variadas entidades, para desenvolver desde o planejamento estratégico até produtos específicos para determinados nichos de mercado.
Governos, empresas, instituições públicas e privadas e organizações não governamentais usam as informações do IBGE para desenvolver seus planos de ação, quantificar o potencial do mercado, criar produtos e serviços respeitando os anseios da população, etc.
As informações do IBGE são fundamentais para o desenho e a confecção de roupas de todos os tipos, móveis de uso residencial e empresarial, bancos de automóveis, de metrô, de trens e ônibus, etc.
Suas análises dão suporte para centenas de produtos de sucesso, permitindo inclusive a quantificação do público alvo para a tomada de decisão quanto ao seu lançamento ou retirada das prateleiras.
Além disso, com base nos números referentes à realidade social, é possível planejar a curto, médio e longo prazo. Sabendo quantas pessoas de um determinado perfil estão em cada segmento é possível desenvolver ações destinadas a satisfazer determinadas expectativas com pequena margem de erro.
Saber quantas pessoas têm poder aquisitivo para adquirir determinado produto por determinado preço pode ser a diferença entre o sucesso e o fracasso. Com essa informação é possível dimensionar o ponto de equilíbrio, após o qual o produto passa a ser rentável e, mais importante, verificar se o potencial de vendas está antes ou depois desse ponto.
Para o setor de seguros as informações do IBGE são fundamentais. Não há como imaginar a atividade sem estatísticas confiáveis, nas quais as seguradoras se baseiam, por exemplo, para calcular a longevidade em seus seguros de vida, planos de previdência suplementar e planos de saúde privados.
Mas não são apenas os dados referentes à expectativa de vida que fazem a diferença. Poder aquisitivo, ascensão social, emprego formal e informal, nível de escolaridade, remuneração individual e familiar, participação da mulher no mercado de trabalho, identificação e quantificação das minorias, enfim, todos os fatos referentes à evolução da sociedade interferem nos produtos do setor de seguros.
E a interferência é direta e indireta, ambas podendo ter impacto relevante tanto nos números consolidados, como no resultado individual das companhias.
Neste cenário, um IBGE cujas informações são colocadas sob suspeita presta um desserviço enorme. Sem estatísticas confiáveis as seguradoras passam a operar em ritmo de aposta e não de certeza matemática. E tudo o que o setor não quer, nem gosta, é um quadro como esse.
Tanto faz se o erro é realmente um erro ou se a informação se transforma em erro para agradar os poderosos. Se o erro é erro, falta comprometimento com o trabalho. Se o “erro” é político, falta comprometimento com a verdade. Nos dois casos quem perde é o país.
Voltar à listagem