O grande vilão é o telefone celular
Originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo.
por Antonio Penteado Mendonça
O Brasil tem números dramáticos no quesito acidentes de trânsito. Morrem anualmente vítima deles, algo próximo de quarenta e três mil pessoas e mais de duzentas mil ficam permanentemente inválidas.
As causas são simples de serem explicadas, ainda que sejam difíceis de serem digeridas. Sem estabelecer uma ordem de importância entre elas, merecem ser citadas a imprudência dos motoristas, o consumo de álcool, o desrespeito das normas de trânsito, a morosidade da justiça, a corrupção dos agentes públicos, a falta de projetos adequados para o traçado das vias, a falta de manutenção, a falta de sinalização, a inconsequência de pedestres e ciclistas, o despreparo dos agentes de trânsito e a fiscalização insuficiente. A lista é praticamente inesgotável.
Levantamentos a respeito apontam para um quadro no qual majoritariamente, as vítimas são pessoas jovens e do sexo masculino. E a imensa maioria das mortes é de motociclistas e acontecem na região Nordeste.
Se a quantidade de acidentes com vítimas assusta, imagine o número total de acidentes de trânsito que ocorrem no Brasil, muitos dos quais, pela falta de gravidade ou dificuldade de acesso, não são sequer percebidos pelas estatísticas.
Não seria exagero, numa avaliação conservadora, colocar este número próximo de um milhão de acidentes por ano, englobando desde pequenas batidas sem maior importância até gravíssimos acidentes envolvendo vários veículos de diferentes tipos, com dezenas de mortos e feridos.
Os países desenvolvidos detectaram há alguns anos um novo fenômeno que rapidamente vem se torando um dos principais protagonistas dos acidentes de trânsito: o uso do celular ao volante.
Falar ou digitar o celular enquanto se está dirigindo se transformou na principal causa de acidentes envolvendo veículos. Para muitos motoristas pode parecer sem sentido, ou conversa de gente “conservadora”, mas a realidade tem mostrado de forma insofismável que o uso do celular é incompatível com o ato de dirigir.
Atualmente, nos países desenvolvidos, o uso indevido dos celulares já é a principal causa de mortes no trânsito, sendo responsável por um elevado número de acidentes graves em função da falta de atenção do motorista que está utilizando o celular ao mesmo tempo em que dirige.
As análises criteriosas e confiáveis do caos das ruas brasileiras apontam para um aumento expressivo do número de multas aplicadas aos motoristas que dirigem falando ao celular.
Segundo o Denatran, no primeiro semestre do ano, o número de multas para motoristas que usam celular ao volante atingiu duzentas e sessenta e oito mil infrações em todo o país, um aumento de 167% em comparação ao mesmo período do ano passado.
É número para ninguém colocar defeito, mas está muito abaixo da realidade de nossas ruas. A maioria dos casos em que motoristas falam ao celular dirigindo não é sequer observável, já que a imensa maioria das vias do país simplesmente não são monitoradas, ou ao menos fiscalizadas regularmente pelos agentes de trânsito.
Enquanto os países desenvolvidos dão especial atenção ao fenômeno e em vários deles as seguradoras são eximidas do pagamento das indenizações quando fica provado que no momento do acidente o motorista estava ao celular, no Brasil, lamentavelmente, a situação é completamente diferente. Não se vê um esforço sério em nível nacional, para coibir o uso do celular pelos motoristas.
É verdade que em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro há uma atenção maior, além do que estão sendo tomadas providências concretas para coibir a infração. O aumento do número de multas é decorrente destas ações, mas elas precisam ser expandidas para todo o país e isto não vai acontecer tão rapidamente.
É justamente aí que mora o problema. Não adianta nossas autoridades aumentarem o valor das multas e a fiscalização continuar deficiente. Até que isto seja mudado, milhares de brasileiros continuarão morrendo ou ficando permanentemente inválidos por conta da irresponsabilidade de motoristas que querem que os outros se lixem.
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