Eventos climáticos ficarão mais severos
Originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo.
por Antonio Penteado Mendonça
As chuvas torrenciais que caíram sobre o Rio de Janeiro no começo de abril mostram três coisas: os eventos climáticos estão mudando a frequência, estão aumentando a severidade e o Brasil não tem qualquer política mais séria para tratar o assunto.
No caso, o Rio de Janeiro ter ou não ter equipes de socorro seria absolutamente indiferente. Em qualquer outra cidade do planeta a água causaria danos e pessoas seriam arrastadas exatamente como aconteceu na capital fluminense. Não há como enfrentar a natureza quando ela decide mostrar quem manda e como manda. As cenas mostradas pelas televisões e redes sociais foram impressionantes. Não havia nada que alguém pudesse fazer para conter a violência dos rios que se formaram pelas ruas e morros da cidade.
Carros arrastados, desmoronamento de imóveis, pessoas levadas pela correnteza, danos e destruição de toda sorte são cenas que estão se tornando cada vez mais comuns e sua frequência deve aumentar rapidamente.
Nós ainda não aprendemos as novas regras naturais, mas o que valia até poucos anos atrás simplesmente não serve mais para muita coisa. A experiência climática, as chuvas de verão, as tempestades que sempre varreram o Brasil entre dezembro e março aumentaram o período de risco. Agora podem acontecer em abril e, mais do que isso, podem acontecer em qualquer lugar do território nacional.
O que aconteceu no Rio de Janeiro pode acontecer em São Paulo, Salvador ou qualquer outra cidade, com danos tão graves quanto os mostrados pelas televisões, sem muito aviso prévio, pelo menos no que diz respeito à violência da tempestade.
É ver que nos mesmos dias choveu incessantemente em São Paulo, apenas numa escala menor. E, se choveu em São Paulo, pode chover na Serra do Mar, em cima dos bairros-cota, na beira da Via Anchieta. Uma quantidade de água como a que caiu no Rio de Janeiro teria capacidade para fazer a serra desmoronar e arrastar parte das moradias morro abaixo, causando uma tragédia de enormes proporções.
Os bairros-cota são um exemplo entre centenas de outros espalhados pelo Brasil. Seja na serra fluminense, seja em Santa Catarina, Minas Gerais ou Bahia, a ocupação desordenada do solo ao longo de décadas de irresponsabilidade do Poder Público – que permitiu que áreas sabidamente inadequadas à ocupação humana fossem invadidas, loteadas e vendidas – coloca em risco a vida de milhares de pessoas, hoje, morando em terrenos sujeitos a eventos climáticos capazes de causar danos inimagináveis.
É hora de o Brasil mudar sua política de ocupação do solo. Não é mais possível permitir a ocupação alucinada de regiões inteiras sabidamente sujeitas a danos decorrentes de eventos de origem climática ou deslizamentos capazes de levar de arrasto um morro inteiro.
Exemplos como o sul de Santa Catarina, Blumenau, a serra fluminense, Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, etc., são mais do que suficientes para deixar claro que é hora de se criar políticas regionais e urbanas mais rigorosas para impedir que milhares de pessoas se instalem em áreas de risco.
Se não há como evitar os eventos naturais, nem como limitar seus estragos, há como impedir que as pessoas se instalem em regiões sujeitas a riscos mais graves ou constantes, como as enchentes em bairros como a Vila Pantanal em São Paulo. Não há como não acontecer. Como as casas estão num nível mais baixo do que a calha do Tietê, as águas não têm para onde escoar.
A regra vale para os morros espalhados por todo o país. As chances do terreno encharcado deslizar, arrastando o que estiver no seu caminho, são enormes. Então, não se pode permitir a construção de moradias em suas encostas.
De outro lado, é necessário que o governo e o setor de seguros comecem a discutir um programa de coberturas capaz de minimizar os prejuízos acontecidos em locais seguráveis. Sem isso, os próximos anos cobrarão um preço absurdamente alto. Ou agimos imediatamente ou as mudanças climáticas, no Brasil, serão ainda mais dramáticas do que no resto do mundo.
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