Entre secos e molhados
Originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo
por Antonio Penteado Mendonça
Começo de ano aceita tudo, em matéria de prognóstico econômico-social. É a hora de falar sobre o que deve rolar ao longo do ano. Ninguém tem bola de cristal. Então os comentários variam do otimismo extremo ao pessimismo extremo, como tenho ouvido de alguns grandes especialistas, sobre o Brasil em 2015.
Alguns fatos são incontestáveis. Todos concordam que o crescimento será baixo, a inflação não atingirá o centro da meta e o risco de desemprego é real. Quais os números reais, é impossível dizer, afinal, se trata de previsão e está longe de ser ciência, o que faz com que deva ser entendida como uma balizadora do cenário e não como sua fotografia real. Essa só se formará ao longo do período, na medida em que as coisas forem acontecendo.
O começo da corrida se dá em cenário menos pessimista do que algumas semanas atrás. A nomeação da nova equipe econômica serviu para injetar algum otimismo e, em economia, sistematicamente, o humor do mercado tem peso maior do que a realidade. E isso pode acontecer. A pergunta que fica é se a equipe que assume se manterá no poder por tempo suficiente para desfazer os equívocos cometidos até aqui. A grande dúvida é se a Presidente dará liberdade para seus ministros trabalharem ou se se intrometerá com a sem cerimônia com que o fazia com o Ministro Guido Mantega.
Se a Presidente insistir na tese de que entende de economia, a situação pode se agravar rapidamente, jogando o país num abismo profundo, do qual ainda não dá para ver o fundo. Se ela permitir que a equipe comandada por Joaquim Levy trabalhe com independência, podemos chegar no final do ano com um cenário ainda ruim, mas muito melhor do que poderia ser e com uma luz no fim do túnel, reforçando o otimismo que pode ser a mola da retomada do desenvolvimento.
É um momento delicado. Uma situação que pode comprometer a vida e a saúde de várias empresas de todos os tamanhos e dos mais variados setores. Por exemplo, as usinas de açúcar e álcool estão pedindo socorro faz tempo, com várias dezenas delas inadimplentes, e os bancos sem saber como sair da enrascada, porque tudo o que não interessa a eles é receber as próprias usinas, fazendas ou equipamentos agrícolas.
O setor de seguros está longe desta realidade. Ao longo dos últimos anos, viveu um sólido crescimento e, além disso, tem demanda mais do que suficiente para nos próximos anos dobrar de tamanho.
Mas isso não vai acontecer em 2015. O ano será duro e, como as margens já estão baixas, é possível dizer que algumas seguradoras terão dificuldades para fechar seus balanços no azul. Mas não será a regra. Entre mortos e feridos, no final do ano a maioria das empresas estará saudável e em condições de continuar atuando, oferecendo produtos mais competitivos, desenhados para melhorar a penetração em todas as camadas sociais.
É verdade que ameaças concretas pesam sobre o setor. Violência, trânsito, crime organizado, manifestações, debilidade política, mau funcionamento da saúde pública, crescimento de doenças sexualmente transmissíveis entre os jovens, corrupção, eventos de origem climática, etc. compõem uma mistura perigosa, que pode custar caro para o país e mais caro ainda para as seguradoras.
Como dizia um político paulista: “cautela e caldo de galinha nunca fizeram mal a ninguém”. É hora de caminhar devagar, colocando o pé com todo o cuidado em cima das pedras.
É verdade que crise também significa oportunidade. Mas, neste momento, uma atividade com as características do setor de seguros exige muito cuidado, profissionalismo, estudo e ponderação antes de dar o primeiro passo. Não é hora de arriscar. É hora de jogar no certo.
Da mesma forma que a economia pode caminhar melhor do que se imaginava um mês atrás, também pode acontecer o contrário. Há quem diga que as chances deste cenário são as mais concretas.
Por via das dúvidas, manter o curso em velocidade baixa é a melhor maneira de atravessar águas desconhecidas, debaixo de tempestade. Quem navegar assim tem tudo para se dar bem num ano muito difícil.
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