Em direções opostas
Originalmente publicado no jornal O Estado de S.Paulo
por Antonio Penteado Mendonça
A leitura de grande parte dos balanços de 2014, publicados pelas seguradoras em operação no Brasil, mostra um desenho bastante semelhante. Com as exceções de praxe, há similaridade na primeira e na última linha dos demonstrativos dos resultados. Em quase todos eles a primeira linha subiu, enquanto a última linha desceu. Em outras palavras, boa parte das seguradoras apresentou crescimento de prêmios e redução do lucro.
Umas cresceram mais, outras menos, mas o fato concreto é que em 2014 o setor ainda manteve um crescimento acima da economia nacional, com algumas seguradoras aumentando seu faturamento em patamares como 10, 12 e até 15%, o que não é desprezível, ainda mais num ano onde o Brasil teve crescimento zero.
Esse desempenho não é obra do acaso. Ao contrário, é o resultado do desempenho do setor desde o plano Real, quando a estabilidade da moeda permitiu que a demanda reprimida por produtos de seguros fosse atendida pelo mercado, sem o risco para o segurado das reservas se transformarem em pó, devoradas pela inflação, independentemente dos mecanismos de correção monetária adotados.
Além disso, vale notar que 2014 não foi um ano com desempenho mensal equivalente e balanceado. Entre janeiro e dezembro a oscilação foi significativa, com os resultados da economia piorando mês a mês, numa queda constante e irreversível, que o governo não entendeu e por isso não soube combater.
Foi lamentável ver as previsões se concretizarem e a economia se deteriorar, enquanto o país assistia a um dos maiores esbulhos políticos de sua história, numa campanha eleitoral que pode ser definida como propaganda enganosa e que agora cobra seu preço na queda de todos os indicadores bons, no aumento dos indicadores ruins e na capa da revista “The Economist”, onde uma sambista, com ar desacorçoado, afunda num enorme lamaçal verde.
Ao começar acelerado, com incentivos importantes para a venda de carros zero quilômetros e linha branca, materializados em longos prazos de financiamento, e programas como o “Minha Casa Minha Vida” fazendo de conta que eram coisa séria, 2014 permitiu que as seguradoras começassem o ano aquecidas, faturando em cima da obrigatoriedade da contratação de seguros para garantir a comercialização destes bens e o giro do país.
Acontece que, ao longo dos meses, os indicadores foram se deteriorando, com o roubo e o furto de veículos atingindo patamares inimagináveis, a saúde pública ficando pior, as grandes obras públicas perdendo ritmo, os investimentos escasseando, a indústria apresentando resultados negativos e a corrupção marcando presença cada vez mais firme, até a explosão do escândalo da Petrobrás.
Este cenário significa aumento da sinistralidade das seguradoras. Em função da queda da atividade econômica, é comum a queda da qualidade das políticas de proteção de risco das empresas. É lógica a diminuição da contratação de novos seguros. É razoável o aumento da inadimplência no pagamento dos prêmios. E tudo isso se soma ao apavorante número de acidentes de trânsito, ao mais apavorante número de roubos e furtos de veículos e ao estarrecedor número de roubos de carga, assaltos a bancos, residências e todos os tipos de empresas.
Para fechar o quadro e acabar de explicar porque a última linha do balanço, a linha do lucro, diminuiu, falta falar da inflação e do efeito perverso que ela tem nas contas das seguradoras.
Para ser competitiva, uma seguradora precisa vender suas apólices pelo preço mais baixo possível. Para isso, ela trabalha com resultado industrial negativo e se vale do resultado das aplicações financeiras para compensar o prejuízo com o próprio negócio. Nada que não aconteça nas cadernetas de poupança, onde o banco capta a um custo de 106% e cobre a diferença com a aplicação do dinheiro captado. As seguradoras fazem a mesma coisa. Só que, com uma inflação de 6% ao ano, o resultado real da aplicação encolhe para patamares muito mais baixos do que a remuneração nominal e isso puxa o lucro para baixo.
O duro é que em 2015 deve ser pior.
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