As queimadas e o seguro rural
Originalmente publicado no O Estado de S. Paulo.
por Antonio Penteado Mendonça
Uma grande área do território brasileiro está queimando ou queimou nos últimos tempos. São centenas de milhares de hectares de florestas, cerrados, Pantanal e parques naturais. O fogo, impulsionado pela seca, devorou tudo, destruindo flora e fauna de uma maneira nunca vista nos últimos oitenta anos. As cenas das chamas correndo soltas se tornaram rotina e o esforço dos bombeiros e brigadistas merece todas as condecorações por bravura, até porque, até agora, são em número muito menor do que o necessário e invariavelmente não têm os equipamentos para combater incêndios dessa proporção.
O Pantanal, segundo a Ministra do Meio Ambiente, pode desaparecer nas próximas décadas. Quer dizer, na sua visão, outras tragédias tão grandes ou maiores podem atingir o bioma. Todavia, o Governo Federal, mesmo sabendo com antecedência que a situação era crítica, demorou para agir e até agora fez muito pouco para controlar o presente e menos ainda para garantir o futuro.
Enquanto o fogo segue em sua marcha de destruição, temos muito discurso, reuniões, palavras bonitas, promessas e pouca ação. Como, de acordo com as previsões meteorológicas, a seca deve se prolongar pelo menos até o meio de outubro, com certeza mais uma vasta área será queimada.
Mas se a situação é de tragédia no universo natural, ela terá impactos dramáticos na vida socioeconômica do país, atingindo de frente o agronegócio, quebrando safras, encarecendo os alimentos, elevando o custo de vida, aumentando o desemprego e reduzindo o PIB. Quer dizer, a tragédia é mais extensa do que tem sido pintada e tem pouca coisa que possa ser feita para equilibrar as perdas.
Não há como não se ter a quebra da safra de grãos. Ainda é cedo para se dizer qual o percentual, mas será significativo. E a soma do fogo com a seca impactará o café, os pomares e as florestas plantadas, além da produção dos alimentos produzidos para o consumo interno, comercializados nas feiras e supermercados.
Em São Paulo, as lavouras de cana de açúcar foram as mais atingidas. Fala-se em mais de um bilhão de reais de prejuízos, mas isto é só a perda do produtor. Com a diminuição da matéria prima, as usinas terão queda de produção de açúcar e etanol, de faturamento e, consequentemente, terão prejuízo. E a sociedade também sofrerá. Menos álcool e açúcar quer dizer preços mais caros nas bombas de combustível e nos supermercados, além da diminuição dos volumes de produtos para a exportação.
A maior parte das perdas será suportada pela sociedade. Na medida que o governo não é famoso por auxiliar depois das grandes tragédias, que o digam os moradores de centenas de municípios gaúchos, o grosso da conta vai ficar com os produtores rurais. Os grandes e os pequenos. E os pequenos sofrerão mais.
É verdade, o Brasil tem seguro rural e ele tem cobertura para os danos causados pelo fogo. As seguradoras estão se preparando para pagamentos expressivos, mas eles serão muito menores do que os prejuízos. A grande maioria dos produtores rurais não tem seguro. Como o quadro deve se tornar recorrente, é preciso rever a política para o setor com urgência.