Entrando na folia
Em época de crise, carnaval vira prozac. É mais barato e não tem tarja preta. Quer dizer, todos têm acesso, seja para o bem, seja para o mal.
Nesse mundo cada vez mais de ponta cabeça, onde o avesso do lado certo está no outro lado da foto, fica difícil aguentar o tranco, tocar em frente, sem a ajuda de uma força externa que empurre o corpo e levante o copo.
São Paulo tomou o assunto a sério e hoje são centenas de blocos que saem pelas ruas, cada um com sua toada e suas cismas, mas todos com milhares de pessoas correndo atrás, escondendo as mágoas, repartindo a incerteza, enchendo a cara de alegria, na pulação alucinada, no corpo suado, no esfrega-esfrega e – por que não? – no beijo dado no meio da rua sem outra preocupação, senão beijar.
Beijar é bom! Faz bem pro corpo e pra alma. Dá um tapa na tristeza, alegra a vida e faz tudo ficar mais colorido, no pedacinho de papel voando, na cerveja que já esteve gelada, no abraço, no amasso e no segundo beijo, mais fundo, mais demorado, mais gostoso.
A vida fica de fora. Agora é hora de correr solto, no vento de popa que empurra a festa atrás do caminhão de som. Pode mais quem pula mais. Porque não é verdade que Deus ajuda quem cedo madruga. Quem cedo madruga só acorda cedo. O resto não é bem assim.
Graças a Deus, esse bloco não madruga, é tudo civilizado, dá para chegar mais tarde e pegar a festa no começo.
Ontem foi jogo duro e amanhã será de novo. O importante é não brecar nas curvas, entrar de cabeça, soltar a vela e acelerar com tudo.
Todo grande amor tem um começo, tem que ser encontrado, tem que ser repartido. A única forma de se fazer isso é seguir a festa, beijar, beijar muito, até encontrar a boca certa e aí ficar abraçado para sempre. Até a noite acabar ou a quarta-feira de cinzas chegar.
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