A primavera fora de hora
De repente o cinza triste da cidade grande é quebrado por uma mancha roxa que muda a cor do dia e o humor das pessoas.
Saída do nada, escondida atrás de um muro, ela cresce, sobe pelas paredes de tijolo, se espalha pelo dia e se entrega nos cachos deslumbrantes de uma primavera florida, ainda que fora do tempo.
Dá vontade de parar o carro e ficar ali, vendo a planta maravilhosa balançando lentamente seus galhos carregados de flores, passando por cima do muro, como que fugindo do jardim onde foi plantada.
Dá vontade de deixar a vida tocar em frente e ficar ali, parado na rua de bairro, quase sem trânsito, vendo a natureza interferir no cotidiano da cidade para fazer mais alegre o dia de quem passa pela primavera florida brigando para fugir dos limites da vida.
Quem foi que falou que a vida não para, que o nosso destino é viver apressado, correndo de tudo e em direção a tudo, atrás não se sabe do quê, mas com certeza não atrás da felicidade?
Viver é ver as flores roxas desta primavera fora de tempo, enganada pela possibilidade de fugir do jardim, fazendo o dia mais bonito porque suas flores quebram o cinza triste que se espalha pela cidade – no ar, nos muros, na cor das nuvens, no peito das pessoas.
A cidade é cinza como a alma de quem nunca procurou as flores como solução para continuar tocando em frente. É cinza como a poluição que suja o ar, como o muro pichado, como a mão que se fecha e o olhar que não encara.
Mas, de repente, sem aviso, ela fica colorida e deslumbrante porque, de repente, não mais do que de repente, saindo por cima de um muro, uma primavera explode suas cores. E nos abre todas as possibilidades.
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