Uma nova percepção
Originalmente publicado no jornal Sindseg SP.
por Antonio Penteado Mendonça
Durante muito tempo se falou que o Brasil era abençoado por Deus. Que o país não tinha grandes catástrofes naturais, como furacões, tufões, nevascas, terremotos, tsunamis e o mais que causa danos de todas as ordens ao redor do planeta. Enquanto nações como Estados Unidos, os países europeus, Japão e China padeciam, quase que anualmente, o Brasil corria solto e desembaraçado, sem se dar conta que não era bem assim.
Para o cidadão comum, o Brasil era abençoado por Deus e por isso não sofria com os grandes cataclismos que de tempos em tempos chacoalham o mundo.
Faz algumas décadas este quadro começou a mudar. Não os eventos, mas a percepção do que acontecia regularmente no país e que, nos últimos tempos, fez a ONU incluir o Brasil na lista das 10 nações mais afetadas por eventos de origem climática.
A seca assola o nordeste há séculos. Sua presença opressiva se faz presente em diferentes momentos da história, com resultados os mais dramáticos, entre eles a Guerra de Canudos, vila erguida às margens do Rio Vaza-barris, por Antonio Conselheiro e seus seguidores, a maioria deles fugitivos da seca. Na mesma direção, os milhões de nordestinos que vieram para o sul, o fizeram premidos pela miséria gerada pela seca.
Já as chuvas torrenciais que caem no sudeste todos os verões fazem parte da saga de Martim Afonso de Souza e explicam porque a primeira vila brasileira foi São Vicente e não Cananéia. Antes de voltar para a Baixada Santista, a frota portuguesa permaneceu 40 dias na região do Lagamar, praticamente o tempo todo debaixo de chuva.
E nos papéis da Câmara de São Paulo, encontram-se antigas disposições proibindo habitar a região das várzeas, por causa das enchentes anuais, que, à época, eram responsabilizadas pelas epidemias que dizimavam a população.
Com o café, o fenômeno das geadas adquire importância capital porque atingiam a principal fonte de riqueza do país, destruindo os cafezais e comprometendo a balança comercial, pela queda nas exportações.
E se isso não basta, um único animal, praga terrível na visão dos moradores e viajantes, impediu durante séculos o uso de grande parte do solo atualmente ocupado pelo agronegócio paulista. As formigas e saúvas não permitiam o desenvolvimento de lavouras importantes.
Como se vê, não é verdade que catástrofes e pragas poupavam o território brasileiro. Elas sempre estiveram aí, apenas não eram percebidas por falta de estudos especializados e pela existência de enormes áreas praticamente despovoadas até o começo dos anos 1960.
Com a ocupação do interior e o crescimento das grandes malhas urbanas, invariavelmente em locais pouco propícios para a construção de cidades, o Brasil descobriu o óbvio. As grandes catástrofes naturais são reais, nos atingem e custam caro para o país.
Mais do que isso, hoje é incontroversa a colaboração humana para agravar ainda mais o quadro ruim. A ocupação das várzeas ao redor de São Paulo é consequência direta da especulação imobiliária por causa da imigração a partir da segunda metade do século 19. Os terrenos que mal e mal serviam para plantar arroz foram ocupados por centenas de milhares de pessoas que não sabiam que no verão aquelas áreas inundavam.
A deterioração brutal do solo do Vale do Paraíba não é mais do que consequência direta do plantio do café sem qualquer tipo de cuidado. Blumenau e outras cidades do sul sofrem com as enchentes porque foram erguidas ao lado de rios que inundam na época das chuvas. E por aí vamos, atualmente descobrindo que, com aquecimento global, temos cada vez mais tornados, furacões, granizo, vendavais, ciclones extratropicais e… seca, onde sempre choveu.
O que o país precisa agora, quando temos certeza de que as políticas públicas necessárias não serão rapidamente implantadas, é desenvolver planos de seguros modernos, como os que os países com larga tradição em riscos naturais possuem faz tempo. O que temos hoje não atende mais os segurados e é ruim para as seguradoras. O processo não é complicado. Exige apenas estudos sérios feitos pelas seguradoras e resseguradoras.
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