O passado encarecendo o presente
Originalmente publicado no jornal SindSeg SP.
por Antonio Penteado Mendonça
Diz o ditado que o negócio é andar pra frente, que não adianta chorar o leite derramado, o que passou, passou. Pode ser que seja, pode ser que não seja, mas com certeza para o setor de seguro a coisa é complicada. O passado assombra e cobra caro.
A base do seguro é a ciência atuarial, a estatística, o que já aconteceu, como aconteceu e quanto custou. É com base nessas informações que as seguradoras precificam seus produtos e cobram o valor de cada apólice, levando em conta o segurado e o risco proposto.
Não é por outra razão que o setor de seguros é uma atividade conservadora. A inovação, o desconhecido não podem ser corretamente avaliados com base na experiência passada. O que ainda não aconteceu, no universo do seguro, não tem base matemática para ter um preço. Isso é tudo que as seguradoras não querem.
Acontece que a experiência passada fala de um momento que pode ou não se repetir e isso também pode levar a distorções mais ou menos graves, capazes, por conta de uma anomalia, de encarecer demais o preço da apólice.
Por exemplo, as tempestades de verão inundam, regularmente, várias ruas de São Paulo e essas inundações atingem centenas de veículos. É um dado científico, verificado anualmente pelas seguradoras que operam na carteira de automóvel. Um ano pode ser um pouco mais custoso, outro menos, mas, no fritar dos ovos, fica um pelo outro e a negociação do resseguro de catástrofe, importante para a seguradora se proteger do risco, não foge muito de parâmetros mais ou menos conhecidos.
Todavia, no seguro rural esta regra não vale. Desde 2015, as seguradoras brasileiras vinham tendo um desempenho mais do que satisfatório com ele, tanto que várias companhias que não operavam na carteira decidiram ingressar no negócio. Só que, em 2020, a vaca foi para o brejo. O seguro rural teve uma explosão da sinistralidade e o quadro se repetiu em 2021.
Como me disse o CEO de uma das principais seguradoras do país, as indenizações desses dois anos comeram os resultados positivos dos anos anteriores, criando buracos importantes nas contas de várias seguradoras, que, em alguns casos, tiveram que assumir pesados prejuízos.
A pergunta a ser respondia é se, com base na experiência internacional, não seria possível esperar que, em algum momento ao longo de cinco ou seis anos, o quadro viraria e o lucro se transformaria em prejuízo. E a reposta é: depende. Mas um depende sofrido. Em princípio, em época de mudanças climáticas, todo cuidado é pouco. O que aconteceu não foi a quebra da safra nacional, mas a seca que atingiu o sul e o excesso de chuvas que atingiu parte do centro-oeste.
Como gato escaldado tem medo de água fria, as resseguradoras suspenderam grande parte de suas operações com seguro rural no Brasil. Ninguém sabe o que vai acontecer na próxima safra, mas, por conta dos prejuízos passados, tem agricultor que não conseguiu contratar seguro e tem os que conseguiram por preço muito mais caro. É o fantasma do passado assombrando o futuro.
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