Explosão de fábrica de fogos de artifício
Originalmente publicado no jornal Sindseg SP.
por Antonio Penteado Mendonça
Faz poucos dias aconteceu uma explosão numa fábrica de fogos de artifício em Mina gerais. Quatro mulheres morreram e as instalações foram completamente destruídas. Se a fábrica fosse clandestina, como acontece em boa parte dos acidentes desta natureza, não haveria nenhum tipo de problema – a fábrica não estaria segurada ou, se estivesse, a seguradora, com base no desconhecimento da falta de autorização para operar, poderia negar a indenização.
O problema é que a fábrica em questão era legal. Ela podia fabricar fogos de artifício, vale dizer, ela poderia contratar apólice de seguro para garantir seu funcionamento e os eventuais danos dele decorrentes.
Se tinha ou não, é outro assunto. Mas, supondo que tivesse, e que o seguro fora contratado regularmente, a explosão em tela estaria coberta e a seguradora do risco patrimonial teria que pagar a indenização referente à destruição do imóvel.
Da mesma forma, a seguradora de responsabilidade civil teria que pagar os danos a terceiros causados pela explosão. O que não é possível dizer é se a seguradora deveria pagar também as indenizações referentes à morte de quatro funcionárias. Não porque não fosse possível contratar garantia para este tipo de evento, mas porque não é comum os segurados contratarem a garantia acessória para riscos do empregador em sua apólice de responsabilidade civil.
Já as apólices de seguros de vida e acidentes pessoais não poderiam ao menos levantar alguma objeção. O acidente matou quatro pessoas, o que, se tivessem seguro de vida ou acidente pessoal, geraria a obrigação do pagamento das indenizações aos beneficiários do seguro.
Aliás, com relação aos seguros de vida e acidentes pessoais, ainda que a fábrica fosse clandestina, estes não poderiam se furtar ao pagamento das indenizações. O de vida, por cobrir morte por qualquer causa e o de acidentes pessoais, porque não há como dizer que uma explosão desta natureza não se enquadra perfeitamente no conceito de acidentes pessoais.
Em teoria, o desenho é esse, mas cada seguro, no mundo real, é um negócio específico, no qual as apólices têm ou não as coberturas necessárias para fazer frente, da forma mais eficiente possível, aos riscos do segurado.
A questão que é importante discutir é por que este tipo de risco dificilmente encontra cobertura nas seguradoras brasileiras. Ok, é um risco com probabilidade de ocorrência de sinistro maior do que uma fábrica de pentes? Sem dúvida. Mas, como disse o presidente de uma seguradora norte-americana, especializada em seguros de veículos de militares: “não há risco bom ou risco ruim, o que há são seguros mal contratados, porque as cláusulas são inadequadas ao risco ou porque o prêmio foi mal calculado”.
É isso o que não pode ser perdido de vista. Uma seguradora de riscos patrimoniais tem que conhecer o seguro que ela está aceitando. Não adianta agravar ou dar desconto em função do ramo de atividade do segurado. Não é porque as quitandas costumam ter menos acidentes do que uma indústria química que toda quitanda é um risco melhor do que qualquer indústria química.
Não é assim que as coisas funcionam. Mas é assim que elas estão, pelo menos para bom número de seguradoras que decidiu aceitar ou negar riscos em função da atividade empresarial do segurado.
30 anos atrás o Brasil tinha um mercado de seguros incomensuravelmente menor. No entanto, as seguradoras sabiam aceitar riscos com uma precisão muito mais acurada do que nos dias de hoje.
Ao longo do caminho os pressupostos para a tarifação dos riscos de incêndio foram perdendo a individualização do risco em favor da massificação na venda das apólices. Com isso, centenas de empresas que no passado tinham seguro, porque na época do monopólio o IRB aceitava todos os riscos, foram sendo colocadas de lado. É mais fácil desenhar um modelo teórico e encaixar todo mundo nele do que fazer inspeção de risco, verificar as medidas de prevenção de incêndio, os equipamentos de combate ao fogo e as alternativas de produção em caso de sinistro.
O quadro vai mudar? Seria bom se mudasse, inclusive porque as seguradoras estão deixando de faturar por não aceitarem riscos perfeitamente seguráveis só porque pertencem a uma determinada atividade tida como gravosa.
Ninguém prega a aceitação indiscriminada de todos os riscos. O que merece uma reflexão é se só porque o segurado produz um determinado produto seu risco é obrigatoriamente ruim.
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