O branco e o preto
Que força misteriosa agindo dentro da gente transforma o dia mais cinza numa linda manhã azul? E como ela transforma um lindo dia azul numa tarde cinza?
Eu não tenho as respostas. Algumas situações de perda são óbvias. Mas há todo um universo que passa ao largo, que não marca ostensivamente, que não deixa rastros, que parece não ferir, nem deixa cicatrizes na pele. O que não quer dizer que não retalhe a alma, em cortes finos feitos por navalha e talhos grossos abertos a facão sem corte.
Por que, sem aviso, a manhã azul adquire outra cor dentro da gente? O que leva a leveza do dia a não interferir no peso da alma, no medo do inconsciente, na solidão entre outras pessoas?
Quem nunca se sentiu sozinho e desamparado, cercado de amigos ou no meio de outras pessoas? Quem nunca viveu o peso de uma sensação que chega sem aviso e cai feito uma âncora parando a vida?
As tristezas e as alegrias são únicas e não se repetem. Cada momento tem sua história e o que passou, passou. Não tem volta, exceto na memória, extravasando as boas recordações e os momentos que gostaríamos de esquecer.
É assim porque a vida é assim, porque o ser humano é assim e a vida vem sem olhar o indivíduo, plena, intensa, torta, malquerida, mal-amada, bem-amada, indiferente ao bom e ao ruim que cresce dentro de cada um.
Ninguém tem culpa ou falta de culpa. Culpa é só uma invenção humana para justificar o que não tem explicação. Que culpa alguém tem porque outro alguém gostou ou não gostou?
Tanto faz, o importante é tocar em frente. Ter paciência, aceitar o ritmo incerto dos dias se sucedendo e ter certeza que em algum momento o cinza fica azul, dentro e fora da alma.
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