A maré mudou
Originalmente publicado no jornal Sindseg SP.
por Antonio Penteado Mendonça
No começo de 2014, altos executivos do setor de seguros previam o crescimento da atividade na casa dos dois dígitos, como vinha acontecendo nos últimos 20 anos.
A análise se baseava na demanda reprimida por produtos de proteção patrimonial e na participação da nova classe média emergente na economia. Nos últimos anos, a procura por produtos de todos os segmentos que compõem o setor foi se acelerando, puxada pelo ingresso desse enorme contingente de pessoas na economia formal.
Desde o final de 2013, os sinais apontavam uma redução no ritmo de crescimento do país e um aumento da inflação. Com base neles, os economistas indicavam uma desaceleração importante na atividade econômica nacional, com reflexos em várias áreas da sociedade.
Por que os executivos de seguros continuavam confiantes? Porque o seguro é um setor onde as coisas acontecem em outro ritmo, mas lento, mas mais consistente, e que, depois que começa, como um enorme transatlântico, segue inercialmente por um longo período.
Além disso, a leitura da situação brasileira não estava tão pessimista como os números mostraram logo em seguida.
É verdade que os balanços de várias empresas do setor, referentes ao exercício de 2013, estavam longe de apresentar resultados altamente positivos. É verdade que as resseguradoras locais também não apresentavam lucro consistente, o que ficou claro quando uma análise mais profunda mostrou que, retirando o IRB da conta, em vez de lucro, o segmento estava perdendo dinheiro.
Como se não bastasse, as operadoras de planos de saúde privados também não estavam tendo o desempenho que esperavam, em função do aumento da massa segurada. E a razão é simples: com a chegada dessas pessoas, o custo com a utilização de suas redes cresceu mais do que o faturamento.
Finalmente, a previdência privada aberta, afetada primeiro pela diminuição dos juros, depois pelo aumento da inflação, que não foi compensada integralmente pelo novo aumento dos juros, também foi colocada em cheque.
O resultado é que a previsão inicial de crescimento na casa dos dois dígitos foi deixada de lado e, atualmente, já se fala em patamares muito menores, ainda que acima do crescimento do país.
Diz o ditado que, em terra de cego, quem tem um olho é rei. Crescer acima da média nacional é importante, especialmente para um setor econômico que ainda necessita se consolidar em seu patamar real dentro do PIB brasileiro, mas que, pela natureza do negócio, vai a reboque de outras áreas, como indústria automobilística, construção, varejo, infraestrutura, além de fatores como baixo desemprego nas camadas da classe média, que é a grande consumidora de seguros de vida e acidente pessoais e planos de saúde privados.
A indústria automobilística começa a enfrentar problemas mais sérios para colocar seus produtos no mercado. O consumo em geral começa a cair e a ter reflexos no varejo. A intenção de compra da sociedade começa a arrefecer. As pessoas começam a se preocupar com a possibilidade do desemprego. O Bolsa Família, mesmo com o recente aumento anunciado pela Presidente da República, perdeu valor, comido pela inflação.
São notícias reais e preocupantes, que indicam que 2015 será um ano mais difícil ainda. Elas têm impacto direto no setor de seguros e este impacto já começa a ser sentido pelo mercado. As vendas estão mais difíceis, as margens estão ficando apertadas. Começa o velho e conhecido movimento de “rouba montinho”, no qual, em vez de buscar novos segurados, a preocupação é tirar produção do concorrente.
Como me disse um dos principais executivos do setor, é hora de se prestar atenção e pensar duas vezes antes de fazer o que quer que seja. Já tem gente começando a fazer o que não deve e isso sempre custa caro para o setor.
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